Brasil Energia, nº 486, 19 de abril de 2024 23 Heitor Paiva é analista de mercado e atua em Copenhague como analista do mercado de petróleo e combustíveis marítimos na Maersk. Escreve na Brasil Energia a cada dois meses. Heitor Paiva Biocombustíveis: Desafios geopolíticos e econômicos Os biocombustíveis têm se estabelecido como uma peça fundamental no cenário energético global, impulsionados tanto por iniciativas ecológicas dos governos quanto por preocupações com a segurança energética. Apesar das perspectivas positivas para o futuro, continuam a existir desafios significativos para os combustíveis renováveis. O mercado enfrenta uma série de obstáculos, incluindo a escassez de insumos, processos regulatórios ainda em desenvolvimento e, sobretudo, as complexidades geopolíticas que afetam sua adoção em escala global. O exemplo do Brasil, anteriormente chamado de “Arábia Saudita dos biocombustíveis”, ilustra como a geopolítica desempenha um papel crucial nesse mercado. Isso foi evidenciado mais uma vez em 2023, quando a União Europeia iniciou investigações sobre o aumento do fluxo de etanol brasileiro para a região. O mesmo foi feito com os volumes provenientes dos EUA e Peru. Estima-se que os preços do etanol desses países sejam cerca de 15% mais baixos do que os observados na Europa. A aprovação da Associação Europeia de Produtores de Etanol (ePURE) em “monitorar os fluxos” de países terceiros para a Europa reflete um tipo de “protecionismo verde” que não está diretamente ligado a objetivos ambientais, mas sim a interesses financeiros de certos participantes do mercado. Agricultores europeus, cujos biocombustíveis são altamente subsidiados e, portanto, menos competitivos, fazem parte deste grupo. A oposição ao biocombustível brasileiro muitas vezes é impulsionada por esses interesses. Estes subsídios, no entanto, não são completamente inúteis na ótica europeia; na verdade, eles visam garantir a competitividade do produto europeu. Essa competitividade é afetada pelos custos mais altos de mão de obra e insumos, além da menor produtividade das culturas europeias em comparação com outras regiões. Os subsídios, portanto, procuram equilibrar essa desvantagem e assegurar que os biocombustíveis europeus possam competir no mercado global. Portanto, é fundamental reconhecer que muitas das decisões relacionadas aos biocombustíveis no âmbito legal não são tomadas exclusivamente com base na otimização ambiental, mas sim refletem a busca pela manutenção de privilégios econômicos. Essa abordagem não apenas é equivocada, mas também pode representar um risco significativo para a descarbonização de setores essenciais, comprometendo as metas de neutralidade de carbono.
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