Brasil Energia, nº 486, 19 de abril de 2024 45 Bruno Armbrust, arquiteto e urbanista, foi presidente do grupo Naturgy na Itália e no Brasil. Atualmente é pesquisador associado da FGV Ceri e é sócio fundador da ARM Consultoria. Escreve mensalmente na Brasil Energia Bruno Armbrust Estímulos ao biometano são bem-vindos, mas quem paga a conta? Os grandes grupos energéticos, ao que parece, estão reconfigurando seus aliados. O mais recente exemplo vem da Espanha, onde um grande grupo energético, com presença mundial, anunciou no final de 2023 uma mega aliança com um fundo estatal de Abu Dabi, com o objetivo de investir em renováveis. Esse é apenas mais um entre os muitos exemplos que temos visto ultimamente de movimentos no ambiente empresarial que visam acelerar a descarbonização da economia. Nessa corrida desenfreada, ninguém quer ficar para trás. A busca pela economia descarbonizada está levando alguns países a tentarem estabelecer um prazo de caducidade ao petróleo e ao gás natural. Aí fica uma pergunta: O gás natural não era a ponte para um mundo descarbonizado? É nesse contexto que surge, aqui no Brasil, o Projeto de Lei nº 528 de 2020, que prevê, dentre outras medidas, introduzir compulsoriamente uma mistura gradativa de biometano ao gás natural comercializado, a partir de 1º de janeiro de 2026. E que impacto isso poderá provocar no futuro? As associações participantes do Fórum do Gás já manifestaram sua preocupação de que essa iniciativa poderá gerar aumento do preço do gás natural. É fato que estamos muito atrasados em relação à realidade e às medidas que estão sendo introduzidas na União Europeia – UE no desenvolvimento de projetos de transformação do biogás em biometano. Mas não se pode esquecer que o biometano na UE, além do apelo ambiental, tem o atributo adicional geopolítico, de contribuir para a redução da dependência do gás importado. O biometano, embora relevante no processo de descarbonização e na redução das emissões, ainda não é uma fonte de energia com preços acessíveis a todos. Até aqui, o biometano apresenta custo superior ao do gás natural e essa mistura levará ao aumento do custo final do gás ao consumidor. Na UE, o custo do biometano alcança níveis superiores a US$20/MBtu, podendo variar em razão da característica, da origem e distância da fonte de biometano da infraestrutura gasista. Já o GN tem preços futuros do TTF abaixo dos US$10/MBtu, uma diferença importante. A implementação do PL 528 também vai demandar investimentos em infraestruturas gasistas para conexão das plantas de biometano às redes de gasodutos. Na Espanha, por exemplo, os promotores das instalações de biometano são os responsáveis por custear a interconexão de suas plantas às redes de gás. Os promotores do biometano aqui estariam dispostos a arcar com o custo das interconexões? Serão as distribuidoras obrigadas a realizar esses investimentos? É importante o estímulo à injeção do biometano nas redes, mas em distâncias superiores a 30 - 40 km pode ser mais eficiente o uso do biometano como GNC, abastecendo veículos pesados em substituição ao diesel. Adicionalmente, os investimentos para o fornecimento de um gás mais custoso em relação ao GN também conflita com as regulações estaduais, em que a maioria dos contratos de concessão limita o passthrough às tarifas de um custo mais caro quando há alternativas mais competitivas. O biometano precisa ser incentivado sim, mas devemos evitar obrigações que possam acabar em conflitos e ônus excessivo ao consumidor final. É importante que a introdução de estímulos ao biometano seja feita de forma planejada, observando a regulação nos estados. Cabe ressalvar que o maior custo do biometano pode ter peso menor em segmentos de consumo menos intensivo ou onde o gás tem custo marginal no processo produtivo. Como
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