e-revista Brasil Energia 486

92 Brasil Energia, nº 486, 19 de abril de 2024 Continuação Magda Chambriard Tributos e Preço Mínimo de Referência O desenvolvimento do pré-sal levou a ANP a rever o preço mínimo de referência (PMR) para o pagamento de participações governamentais decorrentes da produção de petróleo. A ideia partiu do reconhecimento de que óleos como os do pós-sal eram mais pesados (e menos valiosos) do que os do pré-sal, e a ANP entendia que não seria socialmente justo calcular royalties e participações especiais do óleo do pré-sal baseando-se na precificação de um óleo mais pesado e mais barato, como o da Bacia de Campos. A relutância da indústria em relação ao ajuste levou o ex-presidente Temer a anular a formulação da ANP, eliminar a comparação com o preço da efetiva comercialização do óleo e a instituir o Preço de Referência do Petróleo (PRP), atualmente em vigor. A seguir, o governo Bolsonaro editou o Decreto 11.175/2022, instruindo a ANP a redefinir o PRP. Ocorre que, entre a primeira iniciativa da agência para alteração dos preços e agora, muita coisa mudou, e a regulação precisa acompanhar as mudanças da sociedade. Naquela época, quase toda a produção nacional era da Petrobras. Cabia calibrar a fórmula de cálculo para uma característica média do petróleo do Brasil, influenciada cada vez mais pelo óleo mais leve do pré-sal. Mas, de lá para cá, dezenas de operadores independentes passaram a atuar em terra e no mar, em horizontes mais rasos, enquanto o pré-sal se tornou campo de trabalho para as empresas de grande porte. Assim, não cabe mais se falar de uma única formulação para o preço do petróleo, baseada no pré-sal. É importante que se distinga o óleo pesado[1] e menos valioso do pós-sal daquele mais leve do pré-sal [2]. Não é cabível que uma fórmula ajustada para o pré-sal, produzido pela Petrobras e parceiras, seja utilizada para valorar a produção do óleo pesado produzido por diversas Independentes do setor. Se isso ocorrer, todos os ativos maduros ou marginais objeto de desoneração em passado recente serão reonerados indevidamente. É, portanto, razoável se esperar que a ANP, ao definir um novo PRP com fórmula calibrada para o pré-sal, determine que essa formulação seja aplicada tão somente para o óleo do pré-sal e que, para os demais óleos, ela continue a adotar a formulação anterior. Dessa forma, se valorariam os óleos de forma justa e se tratariam desigualmente os desiguais, honrando preceitos técnicos norteadores da valoração das diversas correntes de petróleo cru. Ao propor uma nova política, é essencial que o legislador verifique se ela interfere com políticas anteriores, cujo resultado tem ocorrido a contento. É o caso dos incentivos à produção de campos maduros e marginais, e à produção incremental de campos maduros. É irrazoável que o Estado, ao criar políticas que onerem o setor, não excetue casos em que a desoneração foi dada como essencial para a sobrevida de diversos ativos. Assim, em prol da coerência, sugere-se redobrado cuidado na análise da aplicabilidade do decreto de ajuste do Repetro, na análise da aplicabilidade do imposto do pecado ao setor petróleo (afinal petróleo longe de ser pecado é a principal fonte de energia primária do Brasil e do mundo) e na adoção da nova formulação do PRP, pela ANP. Nesse último caso, recomenda-se firmemente que se tratem desigualmente os desiguais, adotando a nova formulação ANP apenas para o óleo dos campos do pré-sal, e mantendo a anterior para os demais casos. Entende-se que a adoção de fórmulas distintas, para o cálculo dos PRP do pré e do pós- -sal, honra os princípios do mercado global para a precificação de petróleo cru e evita sobrecarga tributária para as empresas independentes que operam campos maduros.

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