e-revista Brasil Energia 487

Bruno Armbrust . Edmar De Almeida . Frederico Accon . Gonçalo Pereira . Heitor Paiva . Ieda Gomes . Jerson Kelman . Luiz Eduardo Barata . Marcelo Souza De Castro . Márcio Ávila . Osmani Pontes . Paula Kovarsky . Rubem Cesar Souza . Telmo Ghiorzi . Thiago Bao Ribeiro . Wagner Victer . Zilmar Souza ANÁLISES energiahoje.com / petroleohoje.com Ano 43 - No 487 - brasilenergia.com PETRÓLEO O interesse da Petrobras no pré-sal da Bacia de Campos TRANSMISSÃO Empresas preocupadas com logística dos equipamentos BIOENERGIA O etanol mais produtivo na mesma área plantada INOVAÇÃO A demanda da indústria na cláusula de PD&I ENTREVISTAS • Ernani Machado, Elysian Petróleo • Hugo Nery, Marquise Ambiental TRANSIÇÃO ENERGÉTICA Projetos de terras raras avançam no Brasil HIDRELÉTRICAS Usinas essenciais, mesmo sem grandes reservatórios ESPECIAIS Coberturas em texto e vídeo • Bahia Oil & Gás, Energy • FPSO Brazil Congress COMERCIALIZAÇÃO O Mercado Livre na visão da Delta Energia

2 Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 Diretor Presidente Celso Knoedt Diretores Alessandra Alves Patricia Quintão Rosely Maximo Editora Executivo Rosely Máximo Redatores Ana Luisa Egues Celso Chagas Chico Santos Esther Obriem Eugenio Melloni Fernanda Legey Fernanda Nunes Marcelo Furtado Nelson Valencio Sabrina Lorenzi Colunistas Bruno Armbrust, Claudio Sales, Edmar de Almeida, Eduardo Tobias, Frederico Accon, Gonçalo Pereira , Heitor Paiva, Ieda Gomes, Jerson Kelman, Luiz Eduardo Barata, Marcelo Castro, Márcio Avila, Marcus D’Elia, Mariana Mattos, Osmani Pontes, Paula Kovarsky, Paulo Cunha, Rubem Cesar Souza,Telmo Ghiorzi, Thiago Bao Ribeiro, Wagner Victer, Zilmar de Souza Tratamento de Dados Mauricio Fagundes Programação Visual Ana Beatriz Leta Rafael Quintão ASSINATURAS Assinaturas Alessandra Alves assinaturas@brasilenergia.com.br Tel: (21) 3503-0303 / 98702-4237 A e-revista Brasil Energia é uma publicação aberta, suportada unicamente por seus patrocinadores e anunciantes. Publicada desde março de 1982, disponibiliza um acervo, a maior parte digital, de mais de 40 anos registrando os principais fatos e cenários do setor energético brasileiro Você também pode querer assinar uma das nossas publicações especializadas e receber como bônus acesso antecipado ao conteúdo da revista Brasil Energia: • Brasil Energy: Anual, R$ 1.575; Mensal, R$ 150 • Cenarios Eólica: Anual, R$ 1.390 • Cenarios Gás: Anual, R$ 1.390 • Cenarios Petróleo: Anual, R$ 1.390 • Cenarios Solar: Anual, R$ 1.390 • EnergiaHoje: Anual, R$ 1.220; Mensal, R$ 120 • PetroleoHoje: Anual R$ 1.220; Mensal R$ 120 Atendimento ao assinante Tel: (21) 3503-0303 / 98702-4237 PUBLICIDADE Paula Amorim publicidade@brasilenergia.com.br Rio de Janeiro Lúcia Ribeiro - (21) 97015-4654 São Paulo Alex Martin - (11) 99200-0956 Fernando Polastro - tel/fax: (11) 5081-6681 EDITORA BRASIL ENERGIA LTDA RUA CONSELHEIRO SARAIVA, 28 SALA 601 20091-030 - RIO DE JANEIRO Tel (21) 3503-0303 Afinal, pra que serve mesmo o CNPE? Está lá em sua definição que o Conselho, presidido pelo titular do MME e composto por outros 16 ministros da República, é um órgão de assessoramento da Presidência. Mas será que sua pauta está dando conta dos temas mais relevantes que o país demanda? Esta pergunta levanta dúvidas sobre a eficácia do Conselho Nacional de Política Energética, não sua razão de ser. A começar pela frequência com que se reúne, normalmente duas vezes por ano. Duas reuniões anuais seriam mais do que suficientes se as deliberações produzissem consensos ou indicações sólidas sobre políticas energéticas para facilitar a vida do Presidente da República. Mas os investidores continuam reclamando definições e segurança jurídica do governo, sem as quais não arriscam colocar em risco bilhões de reais no longo prazo. Esta edição da Brasil Energia traz um exemplo. Três dos nossos Colunistas, todos com larga experiência no segmento do gás, não por coincidência batem na mesma tecla; a Nova Lei do Gás, sancionada em 2021, avançou pouco ou está andando para trás? Não é apenas a baixa frequência, mas sobre a pobreza do que delibera o CNPE. Um olhar mais atento sobre as resoluções que publica percebe que o conselho mais parece um apêndice do MME decidindo sobre o que o ministério poderia publicar como portaria e se omitindo nos grandes temas de políticas públicas do setor energético. Enorme desperdício. Ao todo, 16 ministros, representantes de órgãos de governo e da sociedade civil, estes em franca minoria, se reúnem para pouco, muito pouco. Um grupo altamente representativo e razoavelmente diverso para decidir necessariamente temas que ultrapassam as competências de cada ministério. Em 2023, 11 resoluções tipo portarias, sendo 5 em março, 1 em novembro e 5 em dezembro. Em 2022, 14 resoluções do mesmo calibre, algumas para revogar resoluções anteriores. Enquanto isso, nada se discute, nada se delibera e nada se aconselha ao Presidente da República sobre as seguintes questões, entre outras: • Exploramos ou não petróleo na Margem Equatorial e outras regiões potenciais? • Receitas excedentes de Itaipu devem ou não ser repassadas às tarifas? • Quais setores devem liderar os investimentos em armazenamento de energia? • Que políticas públicas devem ser oferecidas ao VE brasileiro à base de etanol? • Que incentivos podem ser oferecidos para levar o gás à indústria e aos fertilizantes? • Como tornar o Brasil de exportador de petróleo em exportador de tecnologia? • Reservatórios das hidrelétricas são benéficos ou não à sociedade? • Vale a pena explorar eólicas offshore antes de esgotarmos os estoques onshore? • Continuamos importadores de tecnologia solar ou promovemos a indústria local? • Quais medidas são cabíveis em relação aos Resíduos Sólidos Urbanos? O país, representado pelos agentes econômicos que geram renda, empregos e impostos, precisa de deliberações responsáveis sobre políticas públicas para o setor energético, com mais celeridade. Como se vê, mais do que arrancar novos impostos, o governo pode fazer sua parte render mais para a sociedade.

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4 Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 acesse nossas redes sociais Editora Brasil Energia BrasilEnergiaEditora editorabrasilenergia @brasilenergia @brasilenergia edição 487 sumário bioenergia 14 O avanço do etanol de segunda geração 40 Panorama do biogás é de crescimento acelerado transmissão 22 Logística de transporte entra na mira das transmissoras hídrica 34 Hídricas sim, até mesmo sem grandes reservatórios 36 PCH Saltinho prevista para inaugurar em 2025 comercialização 46 O Mercado Livre na visão da Delta Energia transição energética 58 Projetos de terras raras avançam no Brasil inovação 50 Indústria quer maior participação no recurso da cláusula de PD&I 69 Cepetro estuda soluções para problemas de escoamento no pré-sal petróleo 72 Forno, Água Marinha e Norte de Brava no radar da Petrobras 90 Gestão Magda Chambriard em busca de novas fronteiras especial 74 Cobertura do Bahia Oil & Gas Energy 2024 100 Cobertura do FPSO Brazil Congress 2024 entrevistas 7 Ernani Machado, Elysian Petróleo 64 Hugo Nery, Marquise Ambiental

Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 5 colunistas 99 HEITOR PAIVA Desafios na descarbonização do transporte marítimo 27 EDMAR DE ALMEIDA Gás: ficaremos com a abertura inacabada? 61 FREDERICO ACCON Conflitos de interesse na distribuição, comercialização e GD 17 GONÇALO PEREIRA Valor e Preço: a chave para o futuro 25 BRUNO ARMBRUST O atraso brasileiro entre os mercados competitivos de gás 29 IEDA GOMES Gás para Empregar - Quo vadis? 39 JERSON KELMAN Faz sentido multar distribuidoras com base no CDC? 93 OSMANI PONTES Pensamento e Desafios de Magda Chambriard 13 MÁRCIO ÁVILA O compliance na cadeia de suprimentos da indústria de óleo e gás 63 LUIZ EDUARDO BARATA Sintomas da governança do setor elétrico indicam risco de colapso 55 MARCELO SOUZA DE CASTRO Talentos em Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática: futuro incerto e nada promissor 43 PAULA KOVARSKY Etanol celulósico: é verdade e é do Brasil 49 RUBEM CESAR SOUZA Entendendo a transição energética na Amazônia – Parte 1 71 TELMO GHIORZI Os desafios da cadeia produtiva da energia eólica 45 THIAGO BAO RIBEIRO O que a Alemanha nos ensina sobre o futuro das renováveis 31 ZILMAR SOUZA Biomassa tem forte expansão em 2024, mas continuidade preocupa 11 WAGNER VICTER Armazenamento de energia gravitacional: um novo horizonte

6 Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 entrevista Ernani Machado Planos da Elysian incluem centro de tecnologia em MG Além dos investimentos em E&P, que podem chegar a R$ 400 milhões, a mais nova petroleira independente mineira tem planos de instalar um novo centro de tecnologia em parceria com universidades e centros de pesquisa | POR ROSELY MAXIMO |

Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 7 Passada a surpresa inicial, quando adquiriu 122 áreas no 4º ciclo da Oferta Permanente da ANP, a Elysian entra agora em nova fase. Além do investimento definido no Programa Exploratório Mínimo (PEM), a empresa diz estar pronta para contratações e vai investir em um novo Centro de Tecnologia, a ser instalado em Minas Gerais com parceiros. Nesta entrevista à Brasil Energia, o CEO da mais nova petroleira independente, Ernani Machado, adianta que já tem contratos com universidades e centros de pesquisa e já desenvolve uma nova tecnologia com pegada ecológica para o setor. Com capital social aumentado dos R$ 50 mil iniciais, quando a empresa foi criada em 2023, para os atuais R$ 45 milhões, qualificada pela ANP como operadora C e com bônus de R$ 6,222 milhões pagos no dia 15 de maio, a Elysian aguarda a assinatura dos contratos de concessão para dar início ao plano de trabalho. A entrada de novos investidores será estudada, mas abrir o capital não está no radar. Machado mostra quanto pretende investir nas áreas, as metas iniciais de produção e ressalta que não tem medo de risco. “A inovação tecnológica é um risco, tal qual a exploração de petróleo. O risco e o empreendedorismo andam lado a lado, se você não quer assumir risco, faça um concurso público no Brasil, que é muito bom”. O que levou o dono de uma empresa de tecnologia, a JMM Tech, a investir no setor petróleo? Ernani Machado: O que ocorreu foi uma tentativa de diversificação dos negócios, uma oportunidade de ampliar a nossa capacidade de desenvolvimento tecnológico no setor de petróleo e gás, porque são tecnologias muito lucrativas. E entramos no mercado fazendo inovação administrativa, porque ninguém nunca tinha pensado que uma empresa de petróleo podia surgir num coworking. E fiz isso porque é mais viável financeiramente, é desnecessário fazer uma empresa para participar do leilão que você nem sabe se vai ganhar, ter uma infraestrutura gigante se eu não sou desse mercado. Se eu tivesse perdido o leilão, eu não teria mais a empresa. Para quem não é do mercado, não foi uma estratégia arriscada comprar um número tão grande de áreas? A ideia era diversificar, eu até queria mais, mas levamos em consideração a análise dos institutos de meio ambiente e retiramos todas as áreas com risco ambiental. Mas reduzimos absurdamente o risco pelo fato de já termos centenas de poços nas áreas que queríamos adquirir.. O investimento para fazer a perfuração é absurdamente menor, até para as licenças ambientais é menor, porque já tem lá o poço, e isso é que nos dará fôlego para iniciarmos já com alguma extração. E hoje campos muito pequenos, com até 10 barris ou me-

8 Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 entrevista Ernani Machado nos, já são lucrativos. Nós iremos explorar áreas que tem muito conhecimento e esse conhecimento me permitirá escolher os melhores locais para iniciar a nossa produção. O acervo de conhecimento dessas áreas é muito antigo... Sim, tem conhecimento da década de 70, até de 50 em alguns lugares. Mas muitas das nossas áreas já têm um poço aberto com petróleo dentro. Na década de 50, quando o poço tinha 10% a 30% de água, já era abandonado. Hoje, com as tecnologias existentes, se extrai com apenas 30% de petróleo no poço. Evidentemente faremos reprocessamento de dados, no meu caso especificamente através de inteligência artificial. A partir da expertise em tecnologia com a JMM, o que poderá ser desenvolvido para a atividade onshore? Eu não vou poder falar muito agora, mas se de fato não for necessário fazer nenhum furo, utilizarei os poços existentes e a tecnologia que nós já estamos desenvolvendo, que trará um grande benefício ambiental. E essa é a minha outra inovação, o mercado vai pirar de novo. Vamos fazer junto com as universidades e centros de pesquisas com os quais estamos fazendo parceria para um novo centro tecnológico em Minas Gerais. Não vou adiantar agora sobre o centro porque quero informar a sociedade junto com nossos parceiros, até para não causar especulação. E que tecnologia é essa que estão desenvolvendo? São as câmeras espectrais, que analisam nossas emissões e fazem um cálculo de quantas árvores devemos plantar para neutralizar essa emissão. É a calculadora de pegada ecológica, que em breve estará pronta e nós vamos testar nos nossos campos primeiro. Espero que as outras empresas também se interessem por isso, porque nós temos que ser ecologicamente amigáveis. Mas se eu não tirar o petróleo, outra pessoa vai tirar e será que vai ter alguma consciência ecológica? O que nós queremos é fazer o que outros fazem com o menor prejuízo possível ao meio ambiente. A empresa agora está com capital social de R$ 45 milhões. Entraram novos investidores? Nós estamos ainda analisando quais serão os nossos investidores, pretendemos definir brevemente. No primeiro momento foi uma resolução para que eu pudesse comprovar a capacidade financeira que a ANP exige. Já avançamos nessa fase, com garantias acima das necessárias, vencemos o leilão e fomos aprovados como operadora C. Pagamos o bônus de R$ 6,222 milhões no dia 15 de maio e agora estamos aguardando a assinatura dos contratos de concessão. A nossa ideia é que, em um breve período, possamos ter investidores, mas não iremos abrir para o mercado, não faremos IPO e nem está no nosso radar.

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10 Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 entrevista Ernani Machado A empresa começou com sete consultores contratados. Como está estruturada agora para a operação? Na verdade, além dos sete consultores contratados para fazer a análise para o leilão, tínhamos mais cinco pessoas do setor ambiental e os advogados. A partir da assinatura dos contratos, vamos efetivar nossos funcionários, já selecionamos 30 pessoas, que é o mínimo necessário para cumprir as regras da ANP. A Elysian comprou 99 áreas na bacia Potiguar, 13 em Sergipe-Alagoas e 10 no Espírito Santo. Qual o plano de investimento para desenvolver essas áreas? O valor total do PEM para todas as áreas é de R$ 192 milhões, a ser investido em cinco anos, especificamente em atividades de exploração, que inclui sísmica, análise e reprocessamento das informações existentes. A probabilidade é que o investimento total, incluindo exploração, descoberta e extração do petróleo, chegue a R$ 400 milhões. Já tem alguma meta de produção? Nós pretendemos alcançar os 2 mil barris/dia nos primeiros dois anos de exploração e acreditamos que conseguiremos chegar a 5 mil barris/dia no quarto ano, antes mesmo de acabar o nosso período de exploração. A empresa já destaca no site que vai usar nova tecnologia para exploração, utilizando estruturas móveis operadas por um centro de comando. Tendo em vista que a grande maioria das áreas adquiridas está na Bacia Potiguar, é lá que deve ser instalado esse centro? Primeiro preciso fazer as análises exploratórias, mas é provável que seja, devido à questão numérica. Potiguar é o local que tem maior produção disparado no onshore. Mas e se tivermos a feliz alegria de encontrar no Espírito Santo uma área maior do que todas? Tudo é possível acontecer. Até o final do ano será o momento de muitas pesquisas para sabermos onde teremos uma sede, o nosso centro de comando de controle. Por que decidiu entrar nesse setor em meio à discussão sobre a transição energética? A sociedade está muito preocupada com a descarbonização, mas as vezes ela nem está entendendo o que é isso. A maior concentração dos gases de efeito estufa não é da extração de petróleo, mas depois que esse petróleo é refinado e vira combustível, vai para o seu tanque de gasolina, seu tanque de diesel, seu motor de maneira geral. Lembrando também que o petróleo faz milhares de outros produtos, vai de roupa ao plástico. A transição energética vai demorar alguns anos, ainda vamos precisar do petróleo por muito tempo. No CNPJ da Elysian constam atividades como venda por atacado de GLP, produtos químicos e petroquímicos, holding de instituições não financeiras. Como essas atividades estão posicionadas na estratégia da empresa? É estratégia futura, mas primeiro temos que passar as fases. É uma estratégia que nós temos e como a estratégia é a alma do meu negócio, eu vou deixar esse mistério no ar. n

Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 11 Wagner Victer é engenheiro, administrador, ex-secretário de Estado de Energia e ex-conselheiro do CNPE. Escreve mensalmente na Brasil Energia. Wagner Victer Armazenamento de energia gravitacional: um novo horizonte Recentemente, o Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, em entrevista, sinalizou que os sistemas de armazenamento de energia poderiam ser considerados em futuros leilões, incluindo o LRCAP 2024. O tema já havia sido abordado na Consulta Pública nº 160, lançada pela Aneel no final de 2023 e destacado em palestras e eventos dos quais participei e artigos. Quanto à regulação destes sistemas, em especial, sugiro a leitura de artigo publicado pela FGV Energia, que detalha desafios e oportunidades de 2024 a 2027. Quando se fala em armazenamento de energia, normalmente pensamos em baterias químicas, sobretudo as de íons de lítio. No entanto, com a crescente demanda mundial por armazenamento de energia, outras tecnologias disruptivas, baseadas em princípios básicos da Física, começam a amadurecer. Por exemplo: a energia potencial gravitacional, uma forma reconhecida de armazenamento de energia que pode ser canalizada por diferentes meios. As hidrelétricas reversíveis, que também estão na agenda regulatória da Aneel, utilizam esse conceito. Além disso, existem exemplos de acumulação de energia potencial em blocos que são elevados e posteriormente transformados em energia cinética para gerar eletricidade. O sistema interligado brasileiro sempre contou com acumulações energéticas por meio de nossas hidrelétricas. No entanto, muitas vezes elas estão distantes dos grandes centros de carga e, frequentemente, devido a efeitos climáticos, têm suas acumulações hídricas reduzidas, diminuindo seu grau de confiabilidade dentro da capacidade histórica plurianual dos reservatórios. A questão é que a armazenagem cíclica anual foi sobrecarregada por um novo fenômeno: a ampliação da disponibilidade de fontes flutuantes de oferta ao longo do dia em nosso sistema interligado. A capacidade instalada de energia solar no país já supera impressionantes 40 GW e essa intermitência e inconstância geram um aspecto problemático conhecido como "curtailment". Isso ocorre quando, durante um período do dia, é gerada uma quantidade de energia muito superior à capacidade de absorção pelo Sistema Interligado Nacional (SIN). Em uma simplificação, é como enfrentar o desafio de "levar o sol para a noite" e é aí que surgem os espaços para a armazenagem, uma ferramenta bastante útil para acelerar a transição energética. O cenário brasileiro certamente apresenta esse desafio e a oportunidade já começa a ser enfrentada de maneira mais ostensiva por outros países. Nesse horizonte promissor de armazenamento gravitacional de energia, a China está na vanguarda com um projeto recém comissionado nos arredores de Xangai, próximo a um parque eólico. Com capacidade de armazenagem de 100 MW, o sistema fornece 25 MW de eletricidade durante 4 horas. Essa inovação utiliza blocos móveis de cerca de 30 toneladas, derivados de um projeto parcialmen-

12 Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 Continuação Wagner Victer te patenteado pela empresa suíço-americana Energy Vault, listada na NYSE. Entre os aspectos positivos dessa solução disruptiva, destaca-se a menor dependência de insumos importados, como as baterias de lítio. Além disso, é um sistema "fabless", ou seja, não requer fábricas centralizadas, já que a produção dos blocos envolve obras de construção civil, fomentando empresas locais. Apenas os sistemas de controle, geradores e motores de ascensão gravitacional são importados. Os projetos de armazenamento gravitacional devem, em breve, se expandir na própria China, com uma grande unidade de 2 GWh, prevista para o interior da Mongólia, e outros cinco projetos nas províncias de Hebei, Shanxi, Gansu, Jilin e Xinjiang, variando entre 100 MWh e 660 MWh, com unidades que podem alcançar 120 metros de altura. O conceito de armazenamento gravitacional já desperta interesse em países como Austrália, EUA e África do Sul. No Brasil, os avanços ainda são incipientes, apesar do potencial para projetos-piloto utilizando as chamadas verbas de P&D. Dessa maneira, seria oportuno que o próximo leilão a ser definido pelo MME permita a participação de sistemas de armazenagem não limitados às baterias químicas, incluindo também as emergentes, como a gravitacional. Essa abertura aumentaria significativamente a competitividade do processo, induzindo uma redução das tarifas ao consumidor final, sem representar riscos adicionais. Tecnologias emergentes, como os sistemas de armazenamento gravitacional e as hidrelétricas reversíveis já demonstraram sua confiabilidade e eficiência em projetos ao redor do mundo. Esses sistemas são capazes de atender às necessidades elétricas com um tempo de resposta inferior a 3 segundos, desempenho superior ao das usinas termelétricas, que requerem horas para atingir a rampa de geração, com um significativo custo para isso. Acredito que a inclusão de diferentes tecnologias de armazenamento nos leilões de energia seria um passo fundamental para modernizar a matriz energética brasileira, tornando-a mais competitiva, em favor dos consumidores. Essa abordagem estimularia a inovação, atrairia investimentos e contribuiria com novas tecnologias para ampliar a segurança energética do país, a longo prazo, e para o processo de transição energética. Oportuno que o próximo leilão admita sistemas de armazenagem não limitados às baterias químicas

Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 13 Marcio Ávila, pós-doutor em direito tributário, é sócio do escritório Márcio Ávila advocacia e consultoria. Escreve mensalmente na Brasil Energia. Márcio Ávila O compliance na cadeia de suprimentos da indústria de óleo e gás Embora as grandes petroleiras possuam departamentos ou diretorias bem estruturadas de compliance e ESG, as pequenas e médias empresas da cadeia de suprimentos ainda carecem de muito desenvolvimento neste quesito. Infelizmente, a maioria dos fornecedores não possui setor de compliance e não está preparada para exigências de ações relacionadas a ESG. É custoso, porém inevitável. Nesse sentido, ainda que o fornecedor possua programa de integridade, precisa ir além do compliance “de papel” ou “cosmético”. O compliance precisa ser efetivo! E qual o papel das grandes petroleiras no incentivo à cultura de compliance dos fornecedores? É salutar que disponibilizem treinamentos com seus fornecedores, de maneira que estejam devidamente cientes da política de integridade da contratante e possam prevenir, inclusive, a queda no faturamento de contratos por inobservância das regras de compliance. O Pacto de Integridade, lançado na Rio Oil & Gas 2018, é um compromisso de 14 empresas líderes da indústria de petróleo, gás e biocombustíveis, associadas do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP)[2]. De acordo com o item 7 do Pacto, as empresas líderes realizam diligências, com base no risco associado, para a seleção, a contratação, a execução e o acompanhamento de negócios com terceiros, com vistas a detectar e prevenir práticas comerciais antiéticas e anticoncorrenciais, ilegais, ou que estejam associadas a restrições/sanções, nacionais ou internacionais. Dentre essas empresas, destaca-se a Petrobras que, como se sabe, é uma sociedade de economia mista. Nessa qualidade, deve observar e fazer cumprir tanto a Lei Anticorrupção quanto a Lei das Estatais e esse aspecto impacta todos os seus fornecedores. Aliás, esta última norma determina que a empresa pública e a sociedade de economia mista adotarão regras de estruturas e práticas de gestão de riscos e controle interno que abranjam previsão de treinamento periódico, no mínimo anual, sobre Código de Conduta e Integridade, a empregados e administradores, e sobre a política de gestão de riscos, a administradores (Lei nº 13.303/2016, art. 9º, inc. VI). A Lei das Estatais estabelece que nas licitações e contratos seja observada, dentre outras diretrizes, “a política de integridade nas transações com partes interessadas” (Lei nº 13.303/2016, art. 32, inc. V). A Portaria CGU nº 909/2015, aplicada pela estatal em questão, exige que a pessoa jurídica apresente, para que seu programa de integridade seja avaliado, o relatório de perfil e o relatório de conformidade do programa (art. 2º). De acordo com o Decreto nº 11.129/2022, que regulamenta a Lei Anticorrupção, a base de cálculo da multa decorrente do PAR sofrerá a subtração de até cinco por cento no caso de comprovação de a pessoa jurídica possuir e aplicar um programa de integridade (art. 23, inc. V). Em suma, a cultura de compliance ainda precisa ser muito difundida na cadeia de suprimentos da indústria de óleo e gás. O compliance efetivo depende de um agir constante. As grandes petroleiras podem e devem disponibilizar treinamentos de compliance com seus fornecedores, de maneira que estes estejam devidamente cientes das políticas de integridade daquelas. Ademais, os próprios fornecedores devem buscar a implementação, em suas estruturas internas, de programas de compliance que tenham por fito o efetivo treinamento e preparo de seus colaboradores quanto à conduta ética da empresa. Trata-se de um dever de colaboração entre os contratantes, além de ser um interesse recíproco das partes. [1] Do inglês, Environmental and Social Governance, isto é, Governança Ambiental e Social. [2] Disponível em: https://www.ibp.org.br/personalizado/ uploads/2018/11/Pacto-Integridade-Industriade-Petroleo-Gas-e-Biocombustiveis_set2018.pdf. Acesso em 04.06.2024. Merece atenção, também, o Guia de Boas Práticas em Integridade Corporativa para o Setor de Óleo e Gás. Disponível em: https:// www.ibp.org.br/personalizado/uploads/2022/10/ guia-de-boas-praticas-em-integridade-coorporativa. pdf. Acesso em 04.06.2024.

14 Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 bioenergia A Raízen inaugurou em maio a nova planta industrial de etanol de segunda geração (E2G), no parque de Bioenergia Bonfim, em Guariba (SP), com investimento de R$ 1,2 bilhão. É a segunda da companhia - a primeira está instalada no parque de bioenergia da Costa Pinto, em Piracicaba (SP) – e a maior do mundo. Com capacidade de produção de 82 O avanço do etanol de segunda geração Raizen inaugura a segunda planta de E2G, apostando no aumento de produção sem aumento de área plantada. São mais 9 plantas podendo chegar a 20. | POR ESTHER OBRIEM | Segunda unidade E2G da Raízen, planta do Bioparque Bonfim tem capacidade de 82 milhões de litros/ano

Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 15 milhões de litros/ano, dos quais 80% já estão contratados, a nova usina eleva a capacidade total de produção de E2G da Raízen para 114 milhões de litros. O E2G tem uma pegada de carbono 80% menor que a gasolina comum brasileira e 30% menor que o Etanol de Primeira Geração (E1G). O reaproveitamento do bagaço de cana-de-açúcar para gerar o produto proporciona aumento de até 50% na geração sem aumento de área plantada, com índice 30% menor de emissão de gases de efeito estufa. O empreendimento também produz açúcar e biogás, que abastece geradores para fornecer energia elétrica para a unidade. O presidente da Raízen, Ricardo Mussa, lembrou que a empresa vai construir nove plantas, todas já com volume negociado em contratos de longo prazo. Cada unidade receberá investimentos de cerca de R$ 1,3 bilhão. As duas próximas plantas serão instaladas nos parques de bioenergia Univalem, em Valparaíso (SP), e Barra, em Barra Bonita (SP). “Temos outras 11 plantas mapeadas, vamos chegar a 20 plantas de etanol de segunda geração e a 1,6 bilhão de litros de etanol adicionais sem precisar de um pé de cana-de-açúcar a mais. A nossa estimativa é gerar mais de 17 mil empregos, diretos e indiretos”, destacou. Segundo Mussa, não há dificuldade de vender o produto pela demanda de outros países, como Estados Unidos e Japão. Ele afirmou que a empresa segue a jornada de investir em novas plantas pela demanda crescente e global. A Raízen produz etanol de primeira e segunda gerações, biogás e bioprodutos em 30 parques de bionenergia instalados em 24 estados. Capacitação O parque de Bioenergia Bonfim conta, atualmente, com uma força de trabalho de 2.500 pessoas,, sendo 230 para a nova unidade. Além de mobilizar força de trabalho na cidade e em outros municípios da região, como Araraquara, Jaboticabal, Matão, Dobrada, Santa Ernestina, Motuca, Guariba e Taquaritinga. Para capacitar os colaboradores que atuarão nas operações das novas plantas, a Raízen criou o programa de Aprendizagem E2G, com foco em especialização e profissionalização, desenvolvendo competências relativas aos seus processos de produção. O programa tem parcerias com instituições como Senai, Escolas Técnicas Estaduais (ETECs) e BioContal. n RICARDO MUSSA, presidente da Raízen: meta de chegar a 20 usinas de E2G

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Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 17 Gonçalo Pereira, engenheiro agrônomo, é professor na Unicamp e líder do Laboratório de Genômica e Bioenergia. Escreve na Brasil Energia cada 4 meses. Gonçalo Pereira Valor e Preço: a chave para o futuro Tudo é energia, mas ela se manifesta de diferentes formas, que são precificadas a partir do valor percebido. Hoje, o grande desafio da civilização é equalizar Valor e Preço e o papel da ciência é oferecer os elementos objetivos para essa precificação. O mercado, pela sua natureza utilitária, não é capaz de encontrar as melhores soluções. Afinal, “no longo prazo, estaremos todos mortos”. Portanto, cabe aos governos estabelecer os princípios, via políticas públicas, para que a sociedade possa viver em equilíbrio. Com a ciência, descobrimos que o nosso planeta viveu, nos últimos 10.000 anos, o seu período geológico mais estável, o Holoceno, com variações anuais de temperatura média de que não ultrapassavam 1ºC. Nos 100.000 anos anteriores, no Pleistoceno, essa variação era de mais de 10ºC por década, que levavam a um verdadeiro inferno climático. Não por coincidência, foi exatamente a partir do Holoceno que nós humanos, que já perambulávamos pelo planeta há mais de 300 mil anos, fomos capazes de fazer os sucessivos adensamentos de energia, sob a forma de agricultura e comércio, que nos levaram à civilização. Ou seja, a civilização foi resultado da inteligência humana operando em um quadro de estabilidade climática. Entretanto, a inteligência humana não evoluiu com a civilização. Ela é anterior a isso, tendo prosperado na época das cavernas, quando a escassez era a regra, assim como o pensamento de curto prazo. Dessa forma, sempre perseguimos fazer o máximo consumindo o mínimo da nossa própria energia, o que nos levou à Revolução Industrial e ao uso da energia fóssil para substituir o nosso trabalho. Porém, “não existe almoço grátis”. Com o aumento da nossa capacidade científica, constatamos que o uso da energia fóssil estava aumentando vertiginosamente as concentrações de gases de efeito estufa (CO2, metano e vapor d'água), o que poderia levar a alterações da complexa circulação de fluidos do planeta, que é o que define o clima. Definitivamente, com sistemas de extrema complexidade, que estão funcionando, é melhor não mexer. Mas agora é tarde. Já afetamos a atmosfera a ponto de termos interrompido o Holoceno e entrado em uma nova era, o Antropoceno, que se caracteriza pela instabilidade. Olhando pela ótica de uma agência de avaliação de risco, o planeta passou de um grau de investimento AAA para B menos, com tendência a ir para C, nota de “baixo interesse para investidores”. Entretanto, quando se trata do nosso planeta, os investidores somos nós e esse é o nosso único negócio. Se não quisermos falir, ou extinguir, a única coisa a fazer é investir para a melhoria da nota. Dito isso, reduzir as emissões de carbono fóssil e retirar o que já foi emitido da atmosfera é prioridade total. A ampla maioria das pessoas e dos governos reconhece o Valor dessa atividade. Entretanto, isso não é suficiente. Agora temos que colocar Preço nisso para uma ação de longo prazo, o que vai depender da regulamen-

18 Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 Continuação Gonçalo Pereira tação e do mercado. No Brasil, que poderá ser o grande líder desse novo momento da civilização, estamos atuando de forma inteligente na precificação do carbono com programas como o Renovabio e o Combustível do Futuro. Fomos os primeiros a colocar ciência nas nossas legislações a partir do uso das metodologias amplas de Análise de Ciclo de Vida, que é a única forma de entender o que emitimos e precificar o valor da mitigação. Mas esses mecanismos têm que ser ampliados, popularizados, vulgarizados. Só vamos realmente ter sucesso quando o verde se tornar “sexy”, quando fizer parte não apenas da razão, mas do nosso repertório emocional. Uma grande oportunidade para isso está no uso de etanol e no mecanismo do Renovabio. Atualmente, a maior parte dos nossos carros é flex, mas menos de 30% dos consumidores abastece com álcool, o que todos sabem ser melhor para o planeta. Portanto, a razão não é suficiente para a tomada de decisão e temos que usar a emoção para dar um empurrãozinho. Uma forma eficiente de fazer isso seria mexendo positivamente no bolso dos consumidores, a partir da “gameficação” da moeda de carbono do Renovabio, o CBIO. Embora seja comercializado na B3, hoje a cotação do CBIO não é livre. O seu preço está atrelado à obrigatoriedade dos distribuidores de combustíveis de atingir metas de descarbonização, que precisam comprar CBIOs para sua equalização. Assim, para os distribuidores, quanto menos tiverem que pagar pelo CBIO, tanto melhor, mas isso joga contra o preço do Valor da desfossilização. Obviamente, isso tem que mudar. A aquisição de CBIOs por distribuidores deveria ser um mecanismo de regulação secundário, apenas para equilibrar picos de flutuação. Deveríamos simplesmente deixar as forças de mercado funcionarem, na plenitude do seu instinto animal. Temos que aprender com as moedas virtuais, como o Bitcoin, que atingem preços incríveis mesmo sem ter qualquer Valor. Enxergo um cenário em que o consumidor recebe CBIOs cada vez que abastece com biocombustíveis e usa esses para a especulação. Imagino o Preço que essas moedas atingiriam e o incentivo que trariam para o desenvolvimento de uma cadeia de valor desfossilizada, que vai do campo à indústria automobilística e de máquinas pesadas, com todos os seus derivativos de alta tecnologia. E tudo isso com forte geração de renda, desenvolvimento de capital humano e, o mais importante, a melhoria da qualidade de vida das pessoas com a sustentabilidade ambiental. E, como dito no início, tudo é energia e essa pode ser transformada. Por exemplo, petróleo é transformado em dinheiro com a sua venda, que pode ser transformado em produção de biocombustível, se esse for um bom negócio. Se prestarmos atenção, é exatamente isso que está acontecendo atualmente no Brasil. Hoje, as maiores empresas de produção de etanol do país são controladas por companhias de petróleo ou fundos de investimento originados desse setor. Com o tempo, essas empresas passarão a ser simplesmente empresas de energia, que atuarão para maximizar valor. E o principal Valor que temos hoje é a recuperação da nossa atmosfera. Só precisamos agora colocar o Preço certo nisso.

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22 Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 transmissão Logística de transporte entra na mira das transmissoras Assunto é uma das fragilidades que precisam ser atendidas no avanço das obras, segundo diretor da Abrate | POR NELSON VALENCIO | Movimentação da produção de cabos da Alubar necessita de rota restrita

Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 23 O avanço dos projetos de transmissão no Brasil tem números expressivos: de acordo com a Aneel, foram 13 leilões no período de 2016 até o primeiro trimestre deste ano, totalizando R$ 131 bilhões em investimentos e 49 mil km de linhas licitadas. Porém, a questão, agora, é solucionar os gargalos para construir essa infraestrutura. Um dos exemplos é a movimentação de cabos de alumínio para atender à demanda de linhas de transmissão. Segundo Maurício dos Santos, CEO do grupo Alubar, um dos fornecedores do setor, não faltam insumos, mas a logística de entrega é um complicador. Para movimentar as cerca de 100 mil toneladas de cabos de sua produção anual em Barcarena (PA), a empresa depende de uma rota de acesso restrita, inclusive com uso de balsas usadas para o transporte de caminhões com capacidade para 20 toneladas. Em conversa com a Brasil Energia, Geraldo Pontelo, diretor técnico da Abrate, destacou que a entidade tem uma iniciativa para identificar os pontos frágeis que suas associadas transmissoras devem enfrentar na fase de expansão atual. No caso da logística, as empresas estão mapeando as rotas de suprimento, o que é um começo para priorizar obras de infraestrutura de escoamento, principalmente no Nordeste, onde estão localizados os corredores mais extensos de linhas. Outra frente de priorização é a formação de mão de obra, onde a ação conjunta do setor privado e do governo pode evoluir mais rápido. Pontelo destaca que As empresas estão mapeando as rotas de suprimento, indicativo para priorizar obras de infraestrutura de escoamento

24 Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 transmissão Conheça-nos 11GW 12 GW 1.400KM SE 121 a interlocução acontece com o Ministério da Educação e a meta é identificar as localidades ao longo do traçado de várias linhas de transmissão que podem receber treinamentos profissionalizantes. A partir desse mapeamento, entraria em cena entidades como Senai, responsáveis pela formação local. O piloto da iniciativa envolveu o treinamento de 60 profissionais em Barreiras (BA) no que Pontelo chama de “salas de conhecimento”. Se os desafios de logística e mão de obra estão mais adiantados, o mesmo não acontece com duas áreas críticas: o financiamento dos epecistas, construtoras responsáveis pelas obras de transmissão, e a área de licenciamento. No primeiro caso, Pontelo lembra que a costura da Abrate inclui BNDES e bancos públicos e privados. Por enquanto, o avanço ainda é limitado. O problema de licenciamento, no entanto, preocupa. No caso do Ibama, cujos processos são mais demorados, a fragilidade inclui mão de obra restrita – os mesmos profissionais aprovam projetos em outros segmentos, como da construção de estradas e de dutos. Além de poucos, a remuneração dos técnicos não é atrativa. Para o diretor da Abrate, o desafio envolve ainda o Incra, que não teria mais do que uma dezena de profissionais alocados na liberação de obras de transmissão, e o Iphan, também com uma estrutura limitada. A ação da associação para melhorar o cenário mira no alerta ao MME e outros órgãos do setor. Além dos lotes negociados nos leilões recentes, as transmissoras têm o desafio de potencialmente disputar lotes de concessões vincendas. “Estamos pedindo a regulamentação do decreto 11.314/2022 para que sejam criadas as condições de participação ou não dos investidores”, finaliza. n

Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 25 Bruno Armbrust, arquiteto e urbanista, foi presidente do grupo Naturgy na Itália e no Brasil. Atualmente é pesquisador associado da FGV Ceri e é sócio fundador da ARM Consultoria. Escreve mensalmente na Brasil Energia Bruno Armbrust É sempre saudável olhar para as referências internacionais para fundamentar questões em mercados tão globais como é o de gás natural. A análise de boas práticas em outros países, aliás, é uma das premissas de resolução tomada em abril de 2022 pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), a de nº 3/2022, um ano depois da Nova Lei do Gás (Lei 14.134, de 2021). Naquela ocasião, o CNPE fixou as diretrizes estratégicas para o desenho do novo mercado de gás natural, os aperfeiçoamentos de políticas energéticas voltadas à promoção da livre concorrência nesse mercado e os fundamentos do período de transição. Um mercado de gás saudável, concorrencial, requer um mercado spot líquido, que proporcione a comercializadores e consumidores maneiras efetivas de gerenciar seus balanços e o risco de mercado, reduzindo barreiras de entrada de novos competidores na busca da esperada e necessária competição ‘gás x gás’ no Brasil. Vale olhar para os bons exemplos do exterior. Na Europa, a abertura do mercado de gás na União Europeia (EU) começou em 1998, quando a 1ª Diretiva 1998/30/EC introduziu uma série de normas comuns para todos os países membros, tendo como ponto central a introdução de um ambiente mais concorrencial. Cinco anos mais tarde, em 2023, foi publicada uma nova Diretiva, a 2003/55/EC, visando acelerar a abertura de mercado. Esse processo, é verdade, teve muitas resistências em países como a Espanha e Itália – como se viu, respectivamente, com o grupo Gas Natural Fenosa, atual Naturgy, e ENI. Nesses dois países, o aumento da competição passava pela redução da alta concentração existente no mercado. Aqui no Brasil, a Nova Lei do Gás avançou em alguns pontos. Mas ainda estamos muito distantes do que seriam as boas práticas internacionais. A Petrobras ainda detém cerca de 75% do mercado de gás. E não é preciso muito esforço para saber que será lento o aumento da oferta por intermédio do crescimento da produção interna e que, no curto prazo, os terminais de GNL, como os inaugurados pela New Fortress, o TRSP e o Terminal de Sergipe, são os únicos elementos que podem conferir uma maior concorrência e fazer a Petrobras baixar seu preço. Isso fica muito claro em recente entrevista do diretor da Petrobras, Maurício Tolmasquim, segundo o qual a redução de preços anunciada recentemente pela Petrobras tem relação com o aumento da competição com terminais privados de GNL. A avaliação do grau de abertura de um mercado de gás é dada pelo nível de concorrência, do nível de preços e da liquidez do mercado. O nível de concentração de mercado na UE é medido pelo indicador Herfindahl-Hirschman Index (HHI). No entanto, outros indicadores também são utilizados como: taxa de rotação, volume de gás nos pontos de entrada e saída, diversificação de origens de gás no sistema, índice de oferta residual etc. Observando todos esses parâmetros, vemos que ainda estamos muito distantes do que seria uma efetiva e correta abertura do mercado de gás e, assim, é necessário que a ANP estimule projetos que aumentem a concorrência. Também é necessário que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) acompanhe atentamente qualquer eventual tentativa de criação de barreira ao aumento da concorrência no mercado de gás no Brasil. Na Europa há exemplos de ações contra o abuso de posição dominante. Um deles vem da Itália. Nesse país, a Autoritá per l’Energia Elettrica e il Gas da Italia (AEEG) - que tem a responsabilidade de garantir a independência e neutralidade na gestão das atividades em regime de concessão ou autorização consideradas essenciais paO atraso brasileiro entre os mercados competitivos de gás

26 Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 Continuação Bruno Armsbrust ra o desenvolvimento da concorrência - aplicou, em fevereiro de 2006, uma multa recorde na ENI por obstaculizar a concorrência e ainda a obrigou a aumentar em cerca de 10% a capacidade de transporte de gás argelino em favor de outros comercializadores. Na Espanha não foi muito diferente: a Comissão Nacional de Mercados e Concorrência (que lá incorpora funções similares às do Cade) impôs uma série de medidas visando a desconcentração do mercado de gás, dentre outras a venda da participação da Gas Natural Fenosa – atual Naturgy, e na Enagás que realiza a movimentação do gás nos gasodutos de transporte. Projetos como os dos terminais de GNL de São Paulo, Santa Catarina e Sergipe surgem como elementos de extrema importância para aumentar a competição no mercado de gás no país, sempre que interligados aos gasodutos de distribuição e de transporte, e deveriam ter por parte dos órgãos reguladores todos os estímulos e facilidades. Nesse contexto, a ANP colocar qualquer tipo de dificuldade ou condicionante para autorizar a operação de um terminal de regasificação, como a questão que envolve o projeto Subida da Serra em SP, é totalmente incompreensível, causando uma perturbação indesejável nesse momento em que se necessita uma maior competição no mercado de gás. A abertura de mercado, como se viu no velho continente, é positiva. Na Espanha, a Naturgy, que chegou a ter mais de 80% do mercado de gás, comercializa na atualidade cerca de 28,0% do volume total, sendo que os três maiores comercializadores somam 55%. Na Itália, a ENI tem 16% do volume total de gás comercializado, com os três maiores totalizando 44%. Os dois maiores comercializadores têm quase o mesmo market share. Outro bom indicador para avaliar como a abertura de mercado foi importante nos dois países europeus é o HHI, indicador adotado por autoridades antitruste da maioria das jurisdições. Um HHI acima de 2.500 indica um mercado com elevada concentração e baixa competição. Na Espanha, o HHI está em 1.376; na Itália, 807. Números que, em ambos os casos, significam que o mercado de gás tem elevada competição. No Brasil, esse indicador está em cerca de 7.000. Se olhamos esse indicador apenas no Estado de SP, onde se insere o TRSP, esse indicador é ainda maior, superando a marca de 9.000. Para exemplificar o impacto da entrada em operação do TRSP, apenas com 50% de utilização de sua capacidade de regasificação, o HHI do país seria reduzido em quase 2.000 pontos e o de SP seria reduzido à metade. Fica claro que a entrada em operação de novos terminas de GNL abrem um novo e saudável horizonte para reduzir a concentração e aumentar a competição no mercado de gás no país com benefícios aos consumidores e ao custo país. Seguindo a resolução 3/2022 do CNPE, que orienta a adoção das boas práticas, a ANP deveria estabelecer um objetivo no médio e longo prazo para se alcançar um HHI abaixo de 2.500. Para isso, a ANP deverá implementar ações visando que o market share atual da Petrobras, tenha uma redução expressiva, incentivando que existam pelo menos 3 ou 4 comercializadores com cotas de mercado representativas, assim como ocorre em países onde há competição. E para se conseguir isso é necessário um programa de Gas Release dos contratos de gás da Bolívia e dos terminais de GNL da Petrobras, assim como proibir a Petrobras de contratar gás de terceiros. Temos visto sinais recentes muito preocupantes para quem espera um processo de abertura continua, efetiva e saudável do mercado de gás no país. Os órgãos reguladores, ANP e Cade precisam atuar com foco nas boas práticas internacionais, como estabelece a resolução nº 3/2022 do CNPE, como também, estarem atentos para evitar que a política comercial do agente dominante venha a condicionar o futuro do mercado de gás no pais.

Brasil Energia, nº 487, 25 de junho de 2024 27 Edmar de Almeida é economista, professor e pesquisador do Instituto de Energia da PUC-Rio. Escreve na Brasil Energia a cada quatro meses. Edmar de Almeida Co-autor: Felipe Freitas da Rocha* Ao longo de quase três décadas, o mercado de gás natural brasileiro tem passado por um processo de abertura, que se iniciou com as Emendas Constitucionais nº 5 e 9 de 1995 que permitiram a contratação de empresas privadas para a realização das atividades de exploração, produção, importação, exportação, transporte e distribuição. Logo depois, a Lei nº 9.478/1997 (Lei do Petróleo) estabeleceu novas normas para setor de óleo e gás, regulamentando, entre outras coisas, a quebra do monopólio da Petrobras. Em 2009, foi aprovada a Lei nº 11.909/2009 (Lei do Gás) direcionada especialmente às atividades de transporte, embora também tenha abordado as atividades de processamento, estocagem, liquefação, regaseificação e comercialização de gás natural. Embora a Lei do Gás tenha trazido avanços em relação a Lei do Petróleo, ela não foi suficiente para aumentar a concorrência na indústria do gás natural. Os programa Gás para Crescer e o programa Novo Mercado de Gás buscaram identificar uma agenda de mudanças regulatórias promover a abertura do setor. Além disso, a Petrobras e o Cade assinaram o Termo de Cessação de Conduta (TCC) em julho de 2019, que impôs a independência dos transportadores em relação à Petrobras, ao exigir a venda de suas participações nas transportadoras, incluindo NTS, Tag e TBG. Obrigou a desverticalização da Petrobras no setor de distribuição através da venda da sua participação na Gaspetro. Instituiu mecanismo para cessão compulsória de capacidade da Petrobras na NTS e Tag, exigindo a disponibilização de capacidade para novos carregadores. Obrigou a Petrobras a conceder acesso a terceiros às suas infraestruturas de escoamento e processamento (incluindo o arrendamento do Terminal de GNL da Bahia) e proibiu a empresa de adquirir gás de terceiros. O TCC, em conjunto com os desinvestimentos da Petrobras, iniciou uma nova etapa no mercado brasileiro de gás natural. Diversas empresas ingressaram na comercialização do gás natural, como por exemplo a Galp, Shell, Equinor, 3R Petroleum, Origem Energia, PetroRecôncavo. Para isso, muitas delas acessaram as infraestruturas de escoamento e processamento da Petrobras e usufruíram da capacidade de transporte disponibilizada pela empresa na NTS e Tag. Todo esse aperfeiçoamento da abertura do mercado de gás brasileiro foi institucionalizado pela Lei nº 14.134/2021 (Nova Lei do Gás), decreta em abril de 2021. Entre outras coisas, essa lei formalizou o Modelo de Entrada e Saída para a aquisição de capacidade de transporte, o conceito de independência do transportador e do distribuidor, o acesso de terceiro às infraestruturas essenciais e o Mercado Organizado de Gás. Além disso, essa lei concedeu mecanismos para a ANP prevenir práticas anticompetitivas e estimular a competitividade no mercado de gás natural. Isto é, essa lei permite que a ANP adote: i) medidas para cessão compulsória de capacidade de transporte, escoamento e processamento (capacity release); ii) programa de venda obrigatória de gás natural de comercializadores que detenham elevada participação no mercado (Gas Release); e iii) medidas para restringir a venda de gás natural na “boca do poço”. Embora a Nova Lei do Gás tenha trazido avanços consideráveis em relação a legislação anterior, seus efeitos sobre o mercado de gás brasileiro ainda são modestos. Isso porque quase nenhum tópico relevante para a abertura desse mercado foi regulamentado. A Nova Lei do Gás conferiu à ANP a responsabilidade de regulamentação de diversos tópicos. EnGás: ficaremos com a abertura inacabada?

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